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6º Tema Expositor: José Elias Borges Barbosa Debatedora: Waldice Mendonça Porto A fala do Presidente: Nesta
sessão de hoje vamos debater um tema que sempre exerce muita curiosidade e
fascínio. O tema programado é AS NAÇÕES INDÍGENAS DA PARAÍBA. E como o assunto
é índio, hoje não vamos compor a tradicional mesa dirigente dos trabalhos. Nós
dirigentes vamos, à moda indígena, nos sentar fora do estrado e nos colocarmos
em cadeiras, em roda, para trocarmos idéias sobre os nativos da Paraíba, como
se estivéssemos numa aldeia dos nossos antepassados. Apenas
quero convidar nosso palestrante, o professor José Elias Borges Barbosa, para
começar sua exposição. Antes, porém, cumpre-me fazer sua apresentação, para
aqueles que ainda não o conhecem. O
professor José Elias é sócio do Instituto Histórico. É nosso etnólogo. É
bacharel em letras anglo-germânicas, falando fluentemente inglês, francês,
alemão e até um pouco de russo. Professor da UFPB, ele é mestre em Letras e doutor em Lingüística.
São inúmeros os trabalhos que tem publicado na matéria que hoje vamos abordar.
Citemos os principais: OS ARIÚS E A FUNDAÇÃO DE CAMPINA GRANDE; OS CARIRIS E A
ORIGEM DO HOMEM AMERICANO; ROTEIRO DRAMÁTICO DOS CARIRIS; O QUE RESTOU DA
MITOLOGIA CARIRI; O BODOCONGÓ – HISTÓRIA DE PALAVRA; O AFAMADO ÍNDIO PIRAGIBE:
SUBSÍDIOS PARA UMA BIOGRAFIA; INDÍGENAS DA PARAÍBA I – CLASSIFICAÇÃO PRELIMINAR;
PADZU: OS CARIRIS NA FELIPÉIAS DE NOSSA SENHORA AS NEVES; INFLUÊNCIA DA LÍNGUA
CARIRI NO PORTUGUÊS DO BRASIL. É,
portanto, a pessoa indicada para tratar do tema. Com a palavra o confrade José
Elias Borges Barbosa. Expositor: José Elias
Borges Barbosa (Sócio do IHGP e professor da UFPB): É um prazer estar novamente no
Instituto para apresentar a síntese de um trabalho sobre os indígenas
paraibanos. Na realidade, o meu interesse pelos indígenas começou em João
Pessoa, quando era rapazinho e ia a Biblioteca do Estado, que era excelente
naquele tempo, onde passei a ser um visitante diário. Foi lá onde despertei
meus estudos pelos indígenas. Comecei a estudar O Tupy, publicado pela
Brasiliana. Em 1948 fui para Campina Grande e lá fiquei preocupado com o nome
Bodocongó. O nome era estranho, porque não parecia uma palavra tupi. Então fui
procurar alguma coisa a respeito de Bodocongó. Quanto mais procurava, não
encontrava nada. Alguns diziam que era uma palavra cariri. Resolvi
fazer uma pesquisa profunda. Passei 30 anos juntando material sobre os
indígenas e particularmente sobre os cariris, principalmente os cariris da
Paraíba. Pouquíssima coisa encontrava nos historiadores. Fui encontrar alguma
coisa em Irineu Joffily, que é o pai da História da Paraíba, juntamente com
Maximiano Lopes Machado. Irineu era mais sintético, Maximiano era complicado,
citando muito documento; apesar de sua seriedade, é considerado como dos
primeiros historiadores da Paraíba. Depois
dos trabalhos de Irineu Joffily passei para os trabalhos dos holandeses e
terminei chegando em Elias Herckmans. Foi aí que comecei a ver alguma coisa. Lá
é exatamente onde ele diz que a Paraíba é ocupada pelos índios tais e tais.
Irineu Joffily tomou todos esses índios citados por Elias Herckmans e os
colocou como sendo cariris, fora os tupis do litoral. Todos do interior, para
ele, eram cariris. E isso vem sendo repetido desde o século passado até os dias
de hoje. É um erro gravíssimo que vem sendo cometido. Já tive ocasião de fazer
várias palestras sobre o assunto, mostrando esse engano. Na
Paraíba havia, no mínimo, três grupos indígenas diferentes. Os tupis, que
habitavam o litoral, e eram divididos em potiguaras, ao norte do Paraíba e os
tabajaras, ao sul do Paraíba. Os tabajaras vieram do São Francisco, da região
de Sergipe. Mas havia um terceiro grupo, que era tido como cariri. Era o grupo
dos tarairiús, e como eles ficaram ao lado dos holandeses e participaram da
guerra contra os portugueses foram praticamente execrados, considerados selvagens
e foram desprezados. Esse grupo era muito pequeno. Somente
com a chegada dos holandeses é que vamos conhecer, com mais detalhes, os
tarairiús, que eram conhecidos pelo nome do principal, chamado Janduí. Janduí
era o cacique que, naquele tempo, comandava 22 grandes tribos no interior do
Ceará, do Rio Grande do Norte e da Paraíba. Janduí era tarairiú, conforme o
nome anotado pelos holandeses. Os tarairiús falavam uma língua diferente do
tupi e do cariri. Os
índios cariris chegaram aqui oriundos do São Francisco, como já disse, se bem
que houvesse um pequeno grupo que estava junto com os tabajaras, os quais foram
trazidos da região pelo cacique tabajara Piragibe, mas esse grupo se dispersou.
Isto está documentado naquela briga entre os franciscanos e os jesuítas. Está
lá a palavra padzu, que é o nome de pai que os índios chamavam com os
padres que o catequizavam. Vejamos
as fronteiras desses índios. Essas fronteiras são muito variáveis. As migrações
eram constantes, havendo um remanejamento muito grande. Na parte do litoral,
estavam os tupis: ao norte do rio Paraíba os potiguaras, e ao sul do rio
Paraíba os tabajaras. Os caetés, que foram os primeiros, já tinham sido
exterminados. Os caetés deviam ter chegado na parte de Itamaracá, tendo sido
exterminados desde a morte do padre Fernando Sardinha. A parte do interior era
toda ocupada pelos tarairiús. A parte sul ao longo do rio Paraíba era ocupada
por poucas tribos cariris. Eram cariris os bultrins de Alagoa Nova, os bultrins
de Pilar, os fagundes, perto de Campina Grande, os carnoiós da região próxima a
Campina Grande. Esses bultrins chegaram até Pilar, centro principal dos cariris
e já tinham sido catequizados no São Francisco, donde vieram, e ficaram ao lado
dos portugueses. Quando
os portugueses começaram a entrar para o sertão começaram a lutar contra os
tarairiús, que tinham sido aliados dos holandeses. Mesmo depois da guerra dos
holandeses, quando foram feitas as pazes, o Tratado de Paz feito entre o Brasil
e a Holanda não citava o perdão aos
índios tarairiús. E Janduí exigiu e os governos português e holandês tiveram
que aceitar, dando perdão a Janduí, que era o cacique tarairiú. O governador
André Fernandes Vieira não tolerava esses índios, que tinham sido combatidos
por ele. Tanto que aprisionou alguns deles aqui e mandou para Portugal e
Portugal devolveu porque já tinha feito as pazes. Para a
conquista do sertão, os portugueses foram entrando e até certo ponto foram
invadindo as terras ocupadas pelos tarairiús. A guerra contra os tarairiús
começou nos anos 1630 e se estendeu até 1730, uma guerra de cem anos. Foi a
maior guerra indígena do Brasil. A dos tamoios não chega nem perto. Foi uma
guerra de cem anos até quase dizimar praticamente quase toda a população
tarairiú. Existe apenas um remanescente tarairiú, que está em Pernambuco, na
serra de Ararobá, próximo a Pesqueira, com o nome de sucurus. Existem lá cerca
de 3.000 índios. Já perderam a língua e ainda têm algumas palavras; eu consegui
coletar algumas palavras e fazer uma comparação de termos, mostrando o
parentesco da língua tarairiú com o grupo jê. Por exemplo, em tarairiú água é
caeté e nos dialetos jês é incoul, mas no cariri é tzu, uma palavra totalmente diferente. Cabeça
é crecar em tarairiú, nos dialetos
jês é cran e no cariri é tsanbu. E assim por diante. Todas essas
palavras fazem com que a gente aproxime
os tarairiús dos jês. Isso não somente já tinha sido feito pelos traços
culturais, etnográficos e físicos, como também pelos traços lingüísticos. Então
não há dúvida, nossos cariris eram aparentados dos jês. Mas isso só foi aceito
recentemente, principalmente através dos trabalhos de Pompeu Sobrinho, do
Ceará, que estudou esse assunto e publicou um trabalho. Apesar disso, os
paraibanos insistiam em dizer: tupi no litoral e cariri no interior. Vejamos
as tribos tarairiús: os janduís (Janduí era o cacique principal); os canindés
(Canindé foi o rei que substituiu Janduí, quando Janduí morreu e continuou a
guerra contra os portugueses); os sucurus, que é um caso interessante
(eles escaparam de ser dizimados porque Sacramento, o primeiro bispo de
Pernambuco foi catequizar esses índios logo depois da saída dos holandeses e
trouxe esses índios para Pernambuco, em Limoeiro, e depois conseguiu com João
Fernandes Vieira e outros as terras da serra de Ararobá, onde estão até hoje.
São os remanescentes dos sucurus da Paraíba e do Rio Grande do Norte). Sobre
esses índios já foram coletadas algumas palavras da língua deles por alguns
membros da Fundação do Índio; outras palavras já haviam sido coletadas por
Nimiendaju e eu pude coletar um vocabulário de mais ou menos 200 palavras para
comparar com os outros topônimos tarairiús das sesmarias, para verificar mais
alguma coisa sobre a língua. A minha
tese de doutorado é sobre a língua cariri. Eu já conhecia a língua tupi, de
modo que eu posso perceber perfeitamente quando a palavra é tarairiú ou é
cariri. Eram
tarairiús os ariús de Campina Grande, os sucurus, os canindés,
os janduís, os pegas, os ariús dos paiacús, os panatis,
e alguns outros grupos menores. Quanto aos cariris, havia os
cariris do oeste da Paraíba porque eles tinham vindo da região do São
Francisco. O centro e o núcleo dos cariris é a Bahia e principalmente aquela
parte de Pernambuco que é exatamente a região de Cabrobó, da Cachoeira de Paulo
Afonso mais abaixo e a cidade de Petrolina. Os índios cariris tinham a sua
capital ali, chamada Aracapá, palavra tupi, que quer dizer “escudo redondo” ou
rodela. De modo que aquela parte do sertão de Pernambuco é conhecida por sertão
de rodela. Isto tudo está relatado no livro que vocês conhecem de Martim de
Nantes, já traduzido para o português. A vinda dos cariris é muito
recente. Os cariris de Sergipe ficaram em João Pessoa e depois os cariris do
São Francisco foram para a região do interior. Eles vieram pelo rio Pajeú,
cruzaram a serra do Jabitacá, pegaram as nascentes do Paraíba e chegaram até
aqui em João Pessoa. Ficaram mais na região de Campina Grande, em Fagundes. Elpídio de Almeida quando estava
escrevendo a História de Campina Grande me perguntou sobre os índios Fagundes,
querendo saber porque os chamavam de índios fagundes. Os índios fagundes
estavam onde hoje é a cidade de Fagundes. E ele perguntou como os índios podem
ter um nome português. É que Fagundes era um dos elementos da Casa da Torre,
que tinha uma ilha no São Francisco. Essa ilha foi denominada de Fagundes e
esses índios vieram dessa ilha. Os cariris da Paraíba vieram da ilha de
Fagundes. Os cariris foram privilegiados
porque Martim de Nantes esteve na Bahia, lá teve contato com esses zubucuá
cariri, do qual descendem nossos cariris; Martim de Nantes escreveu um
catecismo (eu tenho a cópia desse catecismo, que foi publicado em 1706) e noco
Sergipe, outro grande dialeto dos cariris foi estudado exatamente por Mamiami,
um missionário italiano, que chegou lá fez uma gramática e outro catecismo do
outro dialeto. São dois dialetos. O grande Martius, quando esteve aqui no
século passado, fez um dos maiores trabalhos sobre o Brasil, penetrando todo o
interior do Brasil, estudando todas as línguas indígenas. Ele publicou um livro
Glossarium Linguarum Brasiliense, com
88 dialetos indígenas que coletou no sertão durante mais de 10 anos (e passou
30 anos até fazer a Botânica Brasiliense).
O Glossário é um dicionário onde tem essas línguas todas em latim, português e
na língua indígena. Martius era um grande cientista. Na Bahia, ele descobriu
mais dois dialetos: o sabuja e o pedra branca. Isso chegou na
França, e no século passado foi publicado por Lucien Adam um estudo comparativo
dos dialetos da família cariri. Tive muito trabalho, mas consegui também esse
livro. Nesse mapa que agora exibo a vocês
tem a região do oeste com a fronteira do Ceará, exatamente a região dos curemas
e icós. Os icós eu não sabia que eram cariris, mas pouco a pouco
consegui verificar isso. Quanto aos curemas, ainda tenho dúvida, embora os
curemas tenham sido transferidos para Pilar no período colonial, acho porque
eram da mesma língua. Mas, os icós foram transferidos para a região de Missão
Velha, em Juazeiro e em Crato, que é a região dos cariris novos do Ceará. Essa
parte daqui foi colonizada pelo pessoal dos cariris novos da Casa da Torre, que
já vinham do São Francisco. Então há topônimos na região de Sousa e de
Cajazeiras, como pataputé, que era uma palavra cariri e existe uma ilha
e uma cidade Pataputé, lá na Bahia. Os índios cariris não são daqui. Os índios
daqui eram os tarairiús e os potiguaras. Os tabajaras também vieram de fora. Na época do domínio holandês, o
príncipe de Nassau trouxe cientistas, pintores e muita gente para estudar a
natureza das coisas do Brasil. Entre eles Max Grave e Eckhout são os mais
famosos. Zacarias Vagner também foi outro estudioso. Mas Nassau trouxe dois
pintores importantes; um foi Albert Eckhout e o outro foi Franz Post. Nos
trabalhos de Franz Post sobre João Pessoa (já tive ocasião de apresentar esses
trabalhos) existem três quadros, três telas, de João Pessoa, da Paraíba, que
existem no Museu do Louvre, em Paris. Eu consegui uma reprodução de uma. E há
outras duas reproduções. Os quadros mais antigos sobre João Pessoa são esses
três. Os de Franz Post, Zacarias Vagner e Eckhout. Aqui estão dois quadros de
Eckhoutt, conhecidos internacionalmente. Eckhout era um detalhista excelente
para pintar coisas naturais. Ele era
mais ligado à história natural, enquanto Franz Post era mais paisagista.
Eckhoutt mostra em seu quadro a dança
dos tapuias, e durante muito tempo ninguém sabia que tapuia era esse. Na
realidade é a dança dos tarairiús. Depois que foi publicado um trabalho sobre
Eckhout, há cerca de 20 anos, foi possível tirar essa dúvida. No quadro nota-se claramente de um
lado os tarairiús e os tupis e os cariris. Os tarairiús usavam o próprio
propulsor de dardo. O que é propulsor de dardo? É uma lança bem grande com uma
taboca de bambu rachada, tirada os seus nós. Quando eles iam lutar colocavam a
taboca para facilitar o arremesso, alcançando a flecha arremessada 200 metros.
Os tarairiús e cariris só usavam arco e
flecha. Também usavam uma espécie de tacape. Um espécime desse tacape da Paraíba
pode ser encontrado no Museu de Munique. O tacape existente em Munique é
cravejado com pedras. Mais recentemente foi publicado o
maior trabalho de Eckhout, com 800 pranchas, onde ele desenhou os animais da
Paraíba e Pernambuco. Eu consegui agora uma cópia desse trabalho. A dificuldade
em conseguir essa material se deveu à Segunda Grande Guerra. Esse material
estava no Museu de Berlim, que foi bombardeado. Mas ele foi encontrado na
Polônia, porque pouco antes da Alemanha ser invadida, os alemães levaram todas
as caixas de material para um convento de Cracóvia, na Polônia. Esse material
está lá ainda, tornando possível sua publicação com todos os animais desta
região que os holandeses anotaram, inclusive plantas, índios, constituindo-se
num tratado importantíssimo. As aldeias principais dos tupis
eram a de Urutagui, que é a cidade de Alhandra, cujo nome foi mudado por Miguel
Pina Castelo Branco, juiz de fora de Olinda, que só queria dar nomes
portugueses; a aldeia de Jacoca, que é o Conde; a aldeia da Preguiça e
Montemor, que é Mamanguape; a de Acejutiberó, que é a Bahia da Traição;
Piragibe e João Pessoa, Tibiri e Santa Rita, Pindauna e Gramame. Eram as
principais aldeias que haviam por aqui. Localização principal das tribos
cariris no interior, ao longo do rio do Peixe, rio Paraíba e Piancó: chocós e paratiós,
em Monteiro e Teixeira, na fronteira com Pernambuco; carnoiós ou curinoóis,
em Cabaceiras e Boqueirão; bodopitás ou fagundes, perto de
Campina Grande; bultrins, cariri de Pilar, em Alagoa Nova, e
alguns próximos de Bananeiras. Bultrins, por que esse nome? Parece até nome
francês. Na realidade, os cariris quando foram a Recife foram apresentados por
Martim de Nantes a um francês chamado Jean Boltrin, que era muito interessado
pelos índios e tinha aderido aos portugueses na guerra dos holandeses. Daí essa
tribo passou a se chamar bultrins. Os cariris eram agricultores e se
tornaram amigos de Teodósio de Oliveira, pois faziam sua farinha de guerra para
lutar contra os tarairiús. Continuando a localização dos
índios: os icós, no rio do Peixe, Sousa e Conceição, possivelmente os curemas;
localização principal: Sertão, Seridó (seridó é palavra cariri), Curimataú e
parte da região dos Cariris Velhos, mais concentrados na fronteira com o Rio
Grande do Norte e o Ceará. Tribos tarairiús: os janduís,
localizados no Seridó, Piranhas, Sabugi, Santa Luzia, Patos e Curimataú; os ariús,
em rio Piranhas, Sabugi e Seridó (quase tudo na mesma região, com pequenas
separações); os panatis, em Pombal, rio Piranhas e Espinharas; os sucurus,
em Bananeiras, Cuité, rios do Curimataú e Trairi, posteriormente, em 1662, na
região de Monteiro; os paiacus,
nas fronteiras do Rio Grande do Norte com o Ceará, na região do Apodi e
Ribeira do Patu; os canindés, nas fronteiras do Rio Grande do Norte e
Ceará, na região do Curimataú; os genipapis, nas fronteiras com o Rio
Grande do Norte e Ceará; os cavalcantis, em Campina Grande (era uma
facção dos ariús). Os ariús, que foram trazidos por Teodósio, já eram
índios catequizados e batizados e foram localizados Campina Grande pelo próprio
Teodósio – foi o começo de Campina Grande. O cacique dos ariús chamava-se
Cavalcanti porque já era batizado, e os próprios índios de sua tribo passaram a
se denominar de cavalcantis. Os cavalcantis ficaram no centro de
Campina Grande, enquanto os cariris ficaram
na região de Esperança. Finalizando o assunto das
primitivas localizações, temos os genipapis, na fronteira do Rio Grande
do Norte e Ceará e os vidais, na fronteira do Rio Grande do Norte com o
Ceará. Miguel Pina Castelo Branco, na
época do Marquês de Pombal, começou a mudar essas localizações, fazendo muitas
transferências. Para Alhandra, foram transferidos
os paiacús do Apodi; para Bananeiras foram transferidos os canindés,
onde já estavam os sucurus; para Campina Grande, junto com os cariris,
foram transportados os ariús, posteriormente denominados cavalcantis;
para Pilar, foram transferidos os bodopitás de Fagundes; para Limoeiro e
Simples; foram transportados os sucurus do Rio Grande do Norte; para o
Pilar, onde estavam os bultrins,
foram transferidos os curemas de Piancó; para o litoral do Rio Grande do
Norte, foi transportado outro grupo de curemas do Piancó; para o sertão
foram transportados os cariris do Pilar e tupis de Mamanguape;
para São José de Mipibu, foram
transportados os pegas, de Pombal e da serra de João do Vale. Essa serra de João do Vale tem uma
história muito interessante. Houve uma briga lá e o filho de Teodósio, que
cuidava dos índios, quis ficar com a terra deles, então mandou os índios para o
Rio Grande do Norte. Houve um grande conflito, com processo e tudo, mas
terminou sendo esses índios transferidos. O gado foi arrematado. Os índios
tinham o livro de registro do gado, mas o gado foi vendido e foi com o dinheiro
dos índios que foi construída a parte principal de São José de Mipibu e da
cidade Nísia Floresta (antiga Papari), vizinha de São José de Mipibu. Foi
instalada a Câmara com o dinheiro dos
índios, conseguido com a venda do gado que lhe pertencia. Continuemos com as transferências
indígenas: para o Crato, foram transportados os icós, do rio do Peixe;
Herckmans levou os tarairiús
para Valdíria, no Chile (alguns tarairiús chegaram a combater os
espanhóis e os índios mapuchos e araucanos). Os índios da Paraíba ajudaram os
holandeses exatamente em Valdíria, no Chile, só que eles foram derrotados lá e
depois voltaram. E chegaram aqui vestidos com roupas dos araucanos. Alguns comandantes holandeses
levaram alguns tarairiús para combater os portugueses nas colônias da África.
Isso aconteceu em Angola. Os holandeses quando estacionaram na Bahia da
Traição, em 1625, levaram alguns tupis para a Holanda, entre eles Pedro Poty e
Gaspar Paraocaba. João Fernandes Vieira, quando foi governador da Paraíba
enviou alguns tarairiús para Portugal. Estamos fazendo uma rápida síntese
sobre os índios da Paraíba. Aqui no Nordeste nós temos os
únicos remanescentes cariris que existem no Brasil. Onde é que eles estão
situados? Estão na aldeia de Mirandela, em Ribeira do Pombal, lá na Bahia. Eu
até colaborei numa tese de mestrado que foi publicada sobre o assunto. Trouxe,
para mostrar aos senhores, algumas fotografias publicadas na tese. Também um
estudioso francês conseguiu coletar um vocabulário. Eu tenho um vocabulário do
cariri atual falado por esses índios, evidentemente com influência de outras
línguas. O francês conseguiu coletar um vocabulário de cerca de 300 palavras. Pelas gravuras que agora exibo
vêem-se os traços físicos dos cariris, diferentes dos tarairiús e dos tupis; os
cariris são mais aproximados dos tupis. Os tarairiús eram de estatura alta, os
cariris e tupis eram de estatura baixa, porque eles eram descendentes dos
protopolinésios. As três grandes migrações vieram pelo Estreito de Behring, mas
as duas últimas grandes migrações vieram por via transpacífica, eram
protopolinésios. A América do Norte e do Sul fazem uma barreira de Norte a Sul.
Os índios da região da Polinésia conheciam navegação, eram excelentes
navegadores. Um polinésio é capaz de saber, apenas pelo movimento das ondas, se
há uma ilha a 40 quilômetros. Vejamos agora o nosso índio
desenhado por Eckhoult. Vemos na gravura o uso do arco e da flecha e junto do
índio a mandioca, que era o elemento principal. Os índios do Brasil,
principalmente os tupis, tinham conseguido extrair o ácido da mandioca e
conseguiram fazer a farinha. Era a farinha de guerra, como os portugueses
chamavam, às vezes com desprezo, porque eles já tinham a farinha do reino, que
era a farinha de trigo. No começo repudiavam essa farinha, mas depois viram que
para fazer guerra precisavam do beiju branco, que era a farinha de guerra. Através dessas gravuras podemos
verificar as diferenças entre as tribos indígenas da Paraíba. Infelizmente o tempo para esta
exposição não dá para um trabalho mais particularizado sobre cada nação
indígena, o que ficará para outra ocasião. Exibo agora, para vocês, a carta
da fundação de Campina Grande. Esta carta está publicada em artigo do nosso
confrade Wilson Seixas, oferecendo uma excelente contribuição sobre a posição dos
tarairiús na formação de Campina Grande. Esta carta é um documento muito
importante porque ela mostra uma realidade. No texto da carta a gente vê que
Irineu Joffily cometeu um erro grande ao colocar os tarairiús como sendo
cariris. Todos historiadores paraibanos até 20 anos atrás seguiram essas
pegadas. A carta do governador Albergaria
já foi comentada pelo confrade Wilson Seixas quando de sua exposição sobre a
conquista do sertão paraibano, razão por que deixo de comentá-la. Gostaria de mostrar dois mapas
importantes, um deles é de Kurt de Ninhengaju, um dos grandes etnólogos
alemães, que passou a vida todinha aqui no Brasil e aqui morreu. Ele estudou
todas essas tribos, as línguas indígenas. O nome dele era Kurt e outro nome
alemão, mas os índios lhe deram o sobrenome de Ninhengaju, que é uma palavra
guarani. Ele fez esse mapa procurando atender a distribuição geográfica das
tribos e ao mesmo tempo os movimentos de migração desses índios. Essa parte
referente à Paraíba foi reproduzida no Atlas Geográfico da Paraíba, publicado
pelo Governo do Estado. Tem também o mapa de Loukout, que
é um dos grandes antropólogos do mundo, que oferece excelente posição dos
índios da Paraíba em suas localidades. (O expositor mostra o mapa e faz
comentários para o plenário) Ponho-me agora à disposição dos
participantes para qualquer informe. · · · Debatedora: Waldice Mendonça Porto (Sócia do IHGP e do Instituto Paraibano de
Genealogia e Heráldica): Eventualmente, fui indicada como
debatedora desse tema. Este, porém, não é meu campo, mas como estamos fazendo
um debate muito informal, eu gostaria que o expositor desse uma informação
sobre a guerra dos bárbaros. Quando foi que começou na verdade? Porque no
momento em que houve a penetração para oeste já estava havendo aquela confusão
toda com os índios, justamente no período em que estava ocorrendo a guerra dos
bárbaros. José Elias Borges Barbosa: Segundo Serafim Leite começa a guerra com os tarairiús em 1608. A
guerra dos bárbaros só atinge sua parte nevrálgica mais importante a partir de
1687 até o primeiro tratado, em 1694, mas depois ela continuou; depois houve
outro tratado, em 1697; depois foi feito mais outro tratado, em 1730.
Praticamente essa guerra começou antes dos holandeses e se prolongou bastante.
Foi uma guerra de cem anos. E foi a maior guerra indígena do Brasil. Waldice Mendonça Porto: Eu tinha muito interesse nesse aspecto por eu estou fazendo um
trabalho sobre a ocupação do território
paraibano. Para satisfazer à curiosidade da
nossa colega Waldice Porto, eu tenho aqui uma certidão extraída do Arquivo
Ultramarino de Lisboa, de Teodósio de Oliveira Ledo, datada de 20 de janeiro de
1710. Ela diz : “Certifico que levantando-se o gentio em primeiro de fevereiro
de 87 em todos esses sertões da Paraíba e nos do Rio Grande do Norte e Ceará,
matando muita gente e destruindo muitas fazendas de gado vacum e cavalares e
mais criações e muitas casas, ficando senhor de muitas fazendas e para castigar
maior parte de seu furor e estrago, mandou o governador desta capitania, que a
então governava, Antônio da Silva Barbosa, ao capitão mor André Moreira de
Moura com o meu irmão Constantino de Oliveira Ledo”. Ele então sai contando a história
todinha. Aí ele declara a data e o ano: primeiro de fevereiro de 1687.
Anteriormente havia outros movimentos dos índios. José Elias Borges Barbosa: É preciso notar que não havia uma
luta coordenada com todas as tribos marchando contra os portugueses. Nessa fase
nevrálgica o que acontecia era que cada dia as sesmarias iam tomando as terras
dos índios. Era a invasão portuguesa para a conquista dessa região. Os índios
tinham que resistir, e resistiram bravamente até o último homem. Escaparam
poucos, mas os que escaparam ficaram na raça. Podemos lembrar os cruzamentos,
resultando nos cabeças chatas do sertão. Os índios tinham cabeça redonda, mas
no cruzamento com o branco surgiram os cabeças chatas. Também surgiram as
chamadas manchas mongólicas no corpo dos descendentes, mais conhecidas por
genipapo. Genipapo, porque era da cor
do genipapo, que os índios usavam para se pintar. As pessoas que eram
descendentes de índio com branco tinham genipapo, essa mancha mongólica que os
índios tinham, mas os portugueses não tinham. Humberto Cavalcanti de Mello: Tenho algumas perguntas a fazer.
Primeiro, você falou que os tarairiús eram jês, e os potiguaras eram tupis. Os
cariris eram o que? José Elias Borges Barbosa: Pompeu
Sobrinho, grande antropólogo em quem me baseio nos meus estudos, examinou essa
matéria com muito mais detalhes. Ele verificou que os cariris eram mais
aparentados dos tupis. Lingüisticamente, Batista Caetano e outros estudiosos do
século passado, comparando a gramática, acham que os cariris são mais
aparentados dos tupis. Um grande estudioso, Arion Darinha Rodrigues, de São
Paulo, que agora está na Universidade de Brasília, publicou um dos primeiros
trabalhos sobre a língua cariri, e acha que, comparando algumas palavras do
grupo cariri, elas são semelhantes com algumas do grupo macro jê. Penso que isso
pode ser do contato passageiro entre algumas tribos vizinhas dos cariris. Acho
que a base da gramática e do vocabulário cariri é mais ligado ao grupo
brasílico do tupi, do aruaque, o caraíba, tucanos, que são da última leva dos
que vieram pelo oceano Pacífico. Há
vários nomes que soam como tupis. Por exemplo, canindé parece um nome
tupi. Os tarairiús que foram para São José de Mipibu e Nísia Floresta (antiga
Papari) são nomes tupis? José Elias: Canindé é nome tupi. Humberto Mello: Por que esses nomes tupis em uma tribo tarairiú? José Elias: Os tupis eram quem mandavam e sua
língua era uma língua de comunicação geral.. Era o inglês daquele tempo. As
diversas tribos tapuias usavam o tupi. O nome Canindé apareceu quando? Os
documentos holandeses dizem que surgiu o rei Canindé, que falava tupi, mas
era rei tarairiú. E a maior parte dos
nomes de pessoas dos tarairiús era nomes do tupi. Humberto Mello: Antes que os tabajaras chegassem,
quem ocupava essa região ao sul do rio Paraíba? Eram os caetés? José Elias: Eram os caetés, que eram do grupo tupi, também. Humberto Mello: Existem registros,
inscrições rupestres de índios muito antigos, inclusive com uma certa
diferenciação. Não sei se houve alguma datação dessas inscrições na Paraíba. No
Rio Grande do Norte houve e era entre 4.000 a 6.000 anos de antiguidade. Sobre
cerâmica, disse-me Balduíno Lélis que a cerâmica encontrada na região da serra
do Teixeira até Princesa era uma cerâmica de nível de elaboração superior, melhor
do que a encontrada em outras regiões e, segundo ele, essa cerâmica lembrava um
pouco a dos aruaques. Se havia esse povo muito antigo com esse conhecimento
superior, como é que esse povo desapareceu, como é que foi substituído por um
povo de cultura inferior? José Elias Borges Barbosa: Essa cultura mais avançada de
elementos de barro trabalhado, tipo marajoara, era das últimas correntes que
vieram por via transpacífica (a última que veio deu os Aztecas, Incas e Maias).
Mas eles chegaram no máximo a uns 3.000 anos aqui na Paraíba. O mais provável é
1.500 anos. Humberto Mello: O pessoal que fez essas cerâmicas
não é o mesmo que fez as inscrições rupestres? José Elias: Possivelmente, não. Há vários
tipos de inscrições rupestres. Há inscrições mais simples e há inscrições mais
complicadas. Mas o homem deve estar aqui na América latina há cerca de 30.000
anos, conforme os estudos mais recentes feitos na cidade de São Raimundo
Nonato, no Piauí. Os desenhos de lá e de cá são muito semelhantes. Os desenhos
da Pedra do Ingá não podem ter menos de 3.000 anos. Deve ser uns 5.000 anos,
pois é um documento mais antigo, que ainda não estão no registro do domínio
histórico. Humberto Mello: Com esses elementos sem escrita, realmente ficava
difícil chegar a uma conclusão, e a tradução oral é falha. Guilherme d’Avila Lins: Em primeiro lugar, cumprimento o
professor José Elias pela exposição que aqui fez. Farei algumas observações.
Uma delas diz respeito ao fato de se os caetés eram fronteiros dos potiguara no
início da nossa conquista. No começo da nossa conquista os caetés já haviam
sido dizimados ou escorraçados pelo filho de Duarte Coelho de Albuquerque, indo
esses indígenas do Porto do Calvo, os que sobreviveram. De modo que, no
alvorecer da nossa conquista, todo o território da Paraíba e de Itamaracá
estava nas mãos dos potiguara. Tanto é que quando houve a nossa guerra de Tróia
índia o cacique Iniguaçu trilhava por Itamaracá e chegou a Tracunhaém e ali
quem dominava era a facção potiguara. Em janeiro de 1585 chegam aqui os
tabajaras. É hora de desfazer um equívoco, que já está sedimentado na nossa
historiografia, equívoco que foi criado, salvo engano, pelo nosso grande
historiador Horácio de Almeida, que, como ser humano, também pode se equivocar.
Horácio fala de um grande êxodo que aconteceu desde as margens do rio São
Francisco, quando os tabajara tiveram que vir pelo interior para chegarem aqui,
depois de muitos anos, em janeiro de 1585. Esse êxodo existiu, sem dúvida. O
fato a que ele se refere, ele colheu em Frei Vicente do Salvador, que não fala
de data. Frei Vicente Salvador dificilmente fala de data, e quando fala é
preciso ter cuidado, porque ele fala muito de informação oral, como os
cronistas daquela época. Por exemplo, ele vai de boa fé em cima do autor do
Sumário das Armadas e diz que Frutuoso Barbosa chegou aqui a primeira vez em
1579, quando em 1579 ele conseguiu o alvará de el-Rei, mas só saiu de Portugal
em 81. E a segunda vez, foi em 1582. Mas,
segundo Horácio de Almeida, com base nas informações sem data de Frei Vicente
do Salvador, a campanha de preação de índio
foi levada a cabo por Gaspar Dias de Ataíde e por Francisco de Caldas,
este que fora ouvidor da capitania de Pernambuco (como está em Frei Vicente).
Realmente ele fora, porque não podia ser mais, pois como detentor de um cargo
público da Coroa ele não podia prear índio, mesmo que fosse em guerra justa. O
grande equívoco de Horácio é que ele diz que foi em 1573 e aqui chegaram em
1585, doze anos depois. Existe um documento transcrito em português da época,
textual, em 1578, que dá Francisco de Caldas vivo em Olinda, ocupando o cargo
de provedor da capitania de Pernambuco. Isto em 1578. Portanto, esta campanha
de preação de índio tem que ser, no mínimo, contada a partir desta data. Supondo
que tivesse sido ainda do ano de 1578 esta grande preação de índio nas margens
do rio São Francisco, a grande odisséia teria durado apenas de 1578 até 1585, e
não de 1573 a 1585. Esta é uma retificação que precisa ser feita. Vale lembrar
que uma filha de Francisco de Caldas denunciou no Santo Ofício, em Itamaracá,
dizendo-se filha de Francisco de Caldas, que era dos da governança da terra, já
falecido. Isso em 1594. Embora a
gente tenha alguns estudos do tupi na geografia da Paraíba – um tupi restrito
geograficamente – porque eles só dominaram uma pequena faixa do nosso
território (a faixa litorânea), podemos verificar que o predomínio da toponímia
tupi é exatamente nessa faixa litorânea. Saindo dessa faixa, já se perde o
contato com o tupi, ou vai-se perdendo gradativamente o contato com as palavras
de origem tupi. É tempo de se fazer um estudo da toponímia do tupi na geografia
da Paraíba. José Elias: É o que eu estou fazendo. Não
somente do tupi, mas de todas as línguas indígenas. Guilherme d’Avila Lins: Muito bem. Chegou até nós muito
pouca coisa da cultura dos tarairiús, dos cariris, da cultura dos “tapuias”.
Elias Herckmans, se não me engano, foi
o primeiro que deu uma noção superficial, mas real desses índios. Os jesuítas
deixaram muita coisa sobre a cultura do tupi. Existe alguma coisa na cultura
dos tarairiú que os aproxime da dos tupi como, por exemplo, a saudação
lacrimosa, a “couvade” ou “choco”, a ceva do prisioneiro de guerra para poder
ser ritualisticamente devorado? Existem coisas desse tipo? Há notícias sobre
esses costumes? José Elias: Sobre esses costumes com relação
aos tupis e cariris, existe. Porque os cariris também tinham o couvade, que é
um costume mais tupi. No couvade o marido ficava de choco enquanto a mulher
dava a luz. Era o marido quem recebia as visitas, deitado numa rede. Couvade é
um nome francês Waldice Porto: O que Dra. Vilma dizia era que
significava a certidão da criança e a prova de paternidade. Guilherme d’Avila
Lins: Coisas curiosos do costume tupi. O índio quando saia com a
índia carregando a carga, ele tinha que estar livre para guerrear se fosse o
caso. Ele saía à frente, quando saía da taba, porque ela podia correr de volta
enquanto ele enfrentava o perigo. Quando eles voltavam era o contrário, o índio
vinha atrás por ela poderia correr para a taba e ele cobriria a retaguarda.
Existe coisas desse tipo? José Elias: Há uma coisa comum entre os grupos
jês. Por exemplo, aquela corrida do tronco, que era cortado e passava de um
índio para outro, como nossa corrida de revezamento. Isso é testemunhado em
Uris Barbman, quando descreve a visita que fez a Janduí. Eles tinham um costume
que era típico deles e de algumas poucas tribos do Brasil, que era o
endocanibalismo. Que é o endocanibalismo? Quando morria um parente, na guerra
ou por doença, os cariris assavam e
comiam. Guilherme d’Avila Lins: Os tupis faziam isso com a criança defeituosa. José Elias: Dentro dos rituais, eles
trituravam os ossos e cabelos e comiam tudo com mel de abelha. Mel de abelha
era uma coisa típica deles, o que vai diferenciar os tarairiús dos tupis e dos
cariris. Eles eram especialistas em mel de abelha. Eles eram ictiófagos. Os
holandeses descrevem a pesca na Lagoa de Piató. Esse conjunto de costumes os
aproxima de uma cultura mais antiga. Os tarairiús eram mais primitivos que os
tupis, cuja organização era mais valiosa. Eles tinham o sistema de lendas. O
ritual que os cariris tinham é o ritual do fumo, do tabaco. O fumo para eles
era um deus, porque quando fumavam
ficavam inebriados, era como se tivessem contato com os deuses. Os cariris
faziam a festa do fumo. Jeová Mesquita: A minha pergunta é a seguinte: Por
que é que o mapa da Paraíba, no meio do Estado, tem essa cintura? José Elias: Até o século passado o formato do
mapa da Paraíba seguia a demarcação da capitania e pouca gente conhecia a
topografia. Irineu Joffily aborda esse assunto, vinculando ao problema da
influência dos rios e a zona do Seridó. Depois houve outras discrepâncias. O
Rio Grande do Norte e a Paraíba eram uma coisa só. O Rio Grande do Norte se
aproveitou e colocou a parte do Seridó como sendo dele. Esse estrangulamento se
deve à influencia dos rios. Ainda não temos um trabalho bem detalhado sobre as
fronteiras da Paraíba. Marcus Odilon Ribeiro Coutinho: Estou encantado com sua exposição.
Eu gostaria de saber a tradução dos topônimos gargaú, tibiri, acajutibiró
e gurinhém. José Elias: Quanto aos primeiros, são
inegavelmente tupis. Há muitas tentativas de decodificar. Houve uma época no
Brasil que tudo era considerado de origem tupi. Era uma tupimania. O livro
básico para esclarecimentos dessa natureza é o livro de Teodósio Sampaio.
Bodocongó tem várias interpretações, bodopitá, também. Sobre Borborema, tenho a
impressão que é uma palavra cariri. Tibiri é palavra de origem tupi.
Gurinhém, tenho dúvida se é uma palavra
de origem cariri ou tarairiú. Há muitas diversificações. Mas, há três grandes
línguas: o tupi da Amazônia, o tupi da
costa e o guarani, e mais ou menos uns 300 dialetos, além das variações que existem
de tempo em tempo e de região para região. O tupi do Maranhão é bem diferente
do de cá. São três grandes grupos, divididos cada um de 40 a 50 dialetos. Uma coisa é preciso salientar. Os
índios não tinham essa idéia de Brasil, como nós temos hoje. Nem tinham idéia
desse tamanho todo. Eles viviam em tribos pequenas, agrupadas. Algumas tribos
tupis estavam subindo. Eles vinham descendo da região da Amazônia, descendo
para o Paraguai, Argentina, pegaram a costa e foram subindo por aqui, quando
chegaram os portugueses. As tribos não eram uma organização nacional, tipo
estatal, como se verifica hoje. Eram tribos isoladas, brigando umas com as
outras. Da mesma raça, mas brigando umas com as outras pelo domínio das terras. Respondendo à pergunta de Marcus
Odilon, eu afirmo que não existia índio Bruxaxá. Na parte referente a índio
constante do trabalho de Horácio de Almeida, nada é confiável. Ele era muito
teimoso e sobre isso cheguei a discutir com ele. A parte indígena está
totalmente errada., o que é lamentável, porque se trata de um livro muito bom.
Bruxaxá não era índio. Bru-há-há, em francês, significa confusão. Pedro Bruhaha
está na fundação de Areia e é possível que isso tenha gerado essa denominação. Agradeço a atenção de todos, na
certeza de que minha exposição aclarou a posição dos indígenas da Paraíba
nesses 500 anos da descoberta do Brasil. As
Nações Indígenas da Paraíba
Wilson
Nóbrega Seixas:
Humberto
Cavalcanti de Mello: